Liberdade é uma palavra — ou melhor —  um conceito de muitas faces e significados. De algumas décadas pra cá, o termo ganhou novas nuances para as mulheres, que por séculos foram privadas de direitos e subjugadas pela sociedade patriarcal. Após conquistas importantes, cada uma encontrou a própria forma de expressar sua individualidade, gostos e desejos. E vento no rosto, adrenalina na veia e um horizonte à frente sobre duas rodas se tornaram sinônimo de empoderamento para aquelas com corações que não batem, mas contam giros.

E, como todas as vitórias alcançadas pelas mulheres ao longo dos anos, personagens subversivas, ousadas e corajosas precisaram acelerar para abrir caminho para as motociclistas de hoje. Em 1932, Linda Dugeau aprendeu a pilotar, ganhando espaço da revista norte-americana Motocyclist por seus passeios audaciosos. Em 1938, era o início da primeira rede nacional de motociclistas femininas. Dois anos mais tarde, em 1940, Linda e sua amiga, Dot Robinson fundaram o Motor Maids — com 51 membros.

O clube para mulheres motociclistas tinha a elegância como um de seus fundamentos, provando que é possível pilotar sem perder a feminilidade. Mais de 80 anos e muitas mudanças depois, amantes do motociclismo ganharam cada vez mais espaço em um universo majoritariamente masculino, sem padrões ou regras.

No Brasil, um levantamento realizado pela Abraciclo (Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares) em 2021, com base em dados do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), o número de habilitadas para conduzir motos cresceu de pouco mais de 4 milhões em 2011 para 7,8 milhões em novembro de 2020 — o que representa um salto de 96% em nove anos.

Eliana Malizia e As Aceleradas

Inspiração e irmandade

Repórter, piloto de testes, instrutora, empreendedora, mãe, esposa e viajante, Eliana Malizia é pioneira no motociclismo inserido no universo digital. Fundadora do site acelerada.com.br e do movimento de mulheres motociclistas — o Aceleradas — ela destaca a importância da figura da mulher sobre duas rodas como símbolo de força, empoderamento e inspiração.

“O motociclismo feminino representa a força da mulher. Acredito muito que a figura da mulher em cima da moto, seja qual tamanho for, seja uma inspiração para muitas outras. Essa força faz com que muitas delas deixem de lado alguns tabus e partam para a vila de seus sonhos”, comenta Eliana.

Em um mundo ainda tomado pelo machismo, a motociclista salienta que a representatividade feminina em um universo masculino é motivador para mulheres que não se sentem seguras ou não possuem incentivo dentro de casa para pegar a estrada. “São impedidas pelo medo que as pessoas depositam nelas. Isso acontece porque pouco se fala, pouco é publicado nas grandes mídias sobre o universo extraordinário do motociclismo”, avalia.

E assim como o Aceleradas, outros grupos e clubes de mulheres motociclistas surgiram ao longo dos anos. Se em pleno século XXI a palavra do momento é sororidade, no motociclismo o termo ganha ainda mais força, com mulheres incentivando umas às outras a perderem o medo.

“Desde 2008, quando publiquei minhas primeiras matérias, recebo mensagens de mulheres contando sobre a admiração que elas têm por minha coragem ou desabafando sobre seus receios em relação ao perigo de pilotar uma motocicleta. Então, venho buscando responder uma a uma, como forma de ajudar a quebrar tabus, incentivar e motivar”, explica Eliana.

Cristiana Leal, a Kristal, da Ladies of the Road

Mototerapia

Não é nenhuma novidade que as demandas femininas são, em linhas gerais, mais pesadas quando comparadas às masculinas. Trabalho, casa e maternidade são apenas o tripé de jornadas exaustivas que diariamente consomem muitas mulheres. Neste contexto, o motociclismo entra como uma terapia, movida a liberdade, superação e adrenalina.

“O motociclismo mudou a minha vida. Costumo definir esse sentimento juntando duas palavras: motovida. Assim como no dia a dia, as mulheres enfrentam muitos obstáculos e desafios. Ao andar de moto também, mas de maneiras diferentes. E foi essa diferença que motivou minha força, que eu nem acreditava ter. As amizades, a superação, a liberdade e a alegria no coração ao pilotar me fazem pensar o porquê eu não fiz isso antes”, reflete Cristiana Sandra Santos, a Kristal, do Ladies of the Road.

O termo “mototerapia” vem sendo difundido já há algum tempo como uma alternativa mais radical para amantes do motociclismo que querem desestressar, unindo lazer e satisfação pessoal. “O universo das duas rodas é realmente maravilhoso. Tira as pessoas da depressão, as deixam mais seguras, produtivas e independentes. É comprovado também que o motociclismo melhora também a autoestima”, pontua Eliana.

Estefania MahinEstefania Mahin, a Estê, embaixadora da Motor Road

Fundadora do canal do YouTube “Na motoca com a Estê” e embaixadora da Motor Road, Estefânia Mahin enxerga a estrada como uma forma de meditação. Ainda em fase inicial de seus conteúdos, ela busca apresentar o motociclismo como um meio de autoconhecimento. “A moto, mesmo quando viajando em grupo, é você ali. É indescritível. Não tem como explicar”.

Mochileira, moto girl, dançarina e integrante do The Litas Nova Lima — filial mineira do coletivo global de mulheres motociclistas, Estefânia é um membro ativo nos eventos do grupo, mas afirma que gosta de ter seus momentos de solitude sobre duas rodas. “Criei fortes amizades nos encontros e não viajo mais tanto sozinha quanto antes. Aprendi a andar em comboio, mas também sinto falta da minha solidão na estrada”.

Dentre seus momentos de solidão mais marcantes, Estefânia destaca a viagem de 8 mil quilômetros percorridos em 52 dias no trajeto entre Belo Horizonte e Chuí, no extremo Sul do país. Pilotando a Menina, sua Intruder 125, ela iniciou o movimento “Do Uai ao Chuí”, contando com o apoio de outros motociclistas para seguir. “Consegui apoio, dinheiro para gasolina, roupas e acessórios. Passei frio, peguei vento e neve na estrada”.


Mariana Piva

Pelo olhar do garupa

Mariana Piva não pilota e nem tem a intenção de aprender, mas isso não a torna menos amante do motociclismo. Viajando na garupa do marido, Flavio Terra, fundador do Los Condes Kustom, ela conta que começou a se interessar pelo universo de duas rodas quando o esposo comprou sua primeira Harley.

“Na adolescência, fui garupa de amigos, mas isso acabou se perdendo com o tempo. Quando o Flavio comprou a moto, fui me interessando e perdendo o medo. Adoro viajar com ele, é uma terapia”, declara.

Mesmo longe do guidão, Mariana revela que é na garupa que ela expressa seu sentimento de gratidão pela vida. “É uma sensação de liberdade e um momento único. Eu rezo e agradeço por tudo”.

Seja na garupa ou no piloto, cada vez mais as mulheres vêm se mostrando as verdadeiras donas da estrada. Superando seus medos, incentivando umas às outras e ganhando cada vez mais espaço e representatividade, as motociclistas de hoje deixariam Linda e Dot orgulhosas.

A equipe da Motor Road deseja a todas um feliz Dia Internacional da Mulher. E para comemorar esse Dia especial, neste sábado (12 de março), mulheres não pagam a Subida da Estrada Velha de Santos! Mais informações: clique aqui!

(*) Créditos das fotos: arquivo pessoal

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